Prof. Lupércio Rizzo – Doutor em filosofia da educação, mestre em educação, especialista em docência e pedagogo -
Imagine se você pudesse conhecer todas as coisas como elas verdadeiramente são. Ou se pudéssemos, por exemplo, ler o pensamento das pessoas. Não creio que seríamos mais felizes. Quem sabe a vida possa ser comparada a um palco de ilusões e por vezes desfazer a ilusão e constatar a realidade pode ser doloroso. Há quem acredite que, na medida em que nos tornamos mais velhos as ilusões diminuem e as pessoas se tornam mais realistas, talvez mais sábias. Mas também dizemos que, por se tornarem menos iludidas, ficam chatas ou pessimistas. Talvez tudo isso também seja uma ilusão. Quem sabe as pessoas muito sonhadoras e que veem um mundo sempre bom sejam tão iludidas quanto as que veem sempre ruim. Pensando bem, o que muda é objeto da ilusão ou a forma de se iludir. Edgar Morin fala muito sobre isso e tem inclusive uma definição interessante: “o conhecimento é um arquipélago de certezas em meio a um oceano de incertezas”. Não só teóricos, filósofos ou cientistas nos alertam que a vida é um teatro de ilusões. Cazuza cantou a tempos algo que permanece atual: “as ilusões estão todas perdidas”, possivelmente uma alusão a um livro chamado Ilusões Perdidas, de Honoré de Balzac. Quem conhece a música sabe que ela diz que precisamos de uma ideologia para viver. Se ideologia é um conjunto de ideias (conceito bastante resumido), precisamos de ideias para dar sentido à vida. Mas ideias são leituras e interpretações da realidade, simples assim.
Quantas certezas deixamos pelo caminho? Projetos que pareciam incríveis, amizades que julgávamos eternas, amores e paixões que pareciam para sempre. Com o tempo aprendemos, como Renato Russo, que “o pra sempre, sempre acaba”. Muito do que lutamos perdeu o sentido ou talvez sejamos nós que passamos a não dar mais sentido a muitas coisas, quem sabe o tempo nos coloque olhando tudo em constante transformação, como se estivéssemos em um trem que passa lentamente pelas paisagens, quando aparecem nos encantam, alegram ou decepcionam, depois olhamos com calma e assimilamos detalhes, comparamos com paisagens conhecidas ou vividas, e depois elas vão ficando mais comuns, na medida em que o trem avança as paisagens já vistas encantam menos, e nossa atenção aguarda a próxima. Novos encantos…
Em “a lista”, Oswaldo Montenegro faz algumas perguntas para as quais todos sabemos a resposta: “Faça uma lista dos grandes amigos, quem você mais via a dez anos atrás…Quantos segredos que você guardava, hoje são bobos ninguém quer saber”. No mundo corporativo isso acontece quando o valor é maior para os projetos e apresentações do que para as realizações e resultados, quando se vive na espuma da onda, no que faz barulho. A ilusão de produzir em alguns momentos, tristemente, parece contar mais que a produção em si. Na vida um professor, muitas vezes se constrói ilusões sobre o resultado didático e moral de uma aprovação ou reprovação. Não passam de apostas, alguma mais racionais, outras mais passionais, mas sempre apostas. Na vida em sociedade isso é gritante na medida em que criamos ilusões sobre as pessoas sem ao menos a pessoa nos ter prometido qualquer coisa. Em tempos de redes sociais, mais do que ser, parecer. Mais que ser visto, ter curtidas. Tempos fluidos de Bauman em que o teatro de bonecos é feito seres humanos ou de zumbis…que de tanto iludir, acaba acreditando que é realmente o que diz ser. De novo Renato Russo: ‘mentir para si mesmo é sempre a pior mentira”. Certamente esse texto é um retrato da minha forma de ver o mundo, da minha ilusão acerca da vida. Possivelmente muito do que penso perderá o sentido, espero que minha ilusão de um mundo mais justo seja a última que eu perca, e que eu a perca apenas quando não for mais capaz de me iludir…. Nesse caso, terei morrido.